Publicado em 20/03/2013

Ofício PR 093/2013 (CM) Belo Horizonte, 20 de março de 2013

Ao: Exmo. Sr. Alexandre Padilha
Ministro da Saúde
chefia.gm@saude.gov.br

Assunto: Solicita explicações sobre a suspensão da distribuição de kit educativo sobre DST/AIDS direcionados a adolescentes e jovens

Senhor Ministro,

A Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) – é uma entidade de abrangência nacional, fundada em 1995, que atualmente congrega 286 organizações congêneres e tem como objetivo a defesa e promoção da cidadania desses segmentos da população. A ABGLT também é atuante internacionalmente e tem status consultivo junto ao Conselho Econômico e Social da Organização das Nações Unidas. A missão da ABGLT é Promover ações que garantam a cidadania e os direitos humanos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, contribuindo para a construção de uma sociedade democrática, na qual nenhuma pessoa seja submetida a quaisquer formas de discriminação, coerção e violência, em razão de suas orientações sexuais e identidades de gênero.

Neste sentido, sentimo-nos na obrigação de solicitar explicações sobre as informações veiculadas pelo jornal “O Estado de São Paulo” no último dia 16 de março, sábado. Segundo a reportagem, o kit educativo composto de seis revistas em quadrinhos que tratam de temas como gravidez na adolescência, homofobia e uso de preservativos teve sua distribuição vetada pela Presidência da República. Em matéria posterior, divulgada pelo site da Revista Exame http://exame.abril.com.br/brasil/noticias/unaids-critica-suspensao-de-kit-educativo-sobre-doenca confirma-se que o veto partiu do Gabinete do Ministério da Saúde.

Ademais, a mesma matéria elucida o acontecido da seguinte maneira: “O presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, deputado Pastor Marco Feliciano, elogiou a decisão. ‘O ministro nada mais fez do que honrar um compromisso de governo. A bancada evangélica já havia manifestado o receio de que o kit circulasse novamente”, afirmou. “Temos a garantia de que qualquer material de conteúdo mais polêmico não circule antes de ser avaliado e sem a nossa aprovação.’”

Tem-se, mais uma vez o patente desrespeito para a laicidade do Estado, ao detrimento da garantia dos direitos humanos, inclusive do direito à saúde por parte de toda a população, indiscriminadamente. A justificativa de que o material não passou pelo Comitê Editorial da atual gestão não procede, uma vez que o mesmo foi produzido na gestão do Ministro Temporão e já vinha sendo utilizado àquela época.

Dados divulgados pelo próprio Governo Federal apontam que a população de gays e outros homens que fazem sexo com homens (HSH) responde por metade dos novos casos de HIV em jovens. A causa disso não está em afirmação do próprio Ministro de que “existe uma geração de brasileiros que não foi sensibilizada com o início da epidemia de AIDS”, mas na omissão do Governo brasileiro em não tratar de forma séria o enfrentamento a esse problema social. http://saude.ig.com.br/minhasaude/2012-11-20/gays-somam-metade-dos-casos-novos-de-aids-em-jovens.html

Políticas de enfrentamento ao estigma e discriminação têm sido escanteadas pelo Governo brasileiro, especialmente a partir de 2011 com a Presidenta Dilma Rousseff. Ações como esse kit educativo, que contou com apoio da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) em sua elaboração, estão sob mira constante do fundamentalismo religioso incrustado na Esplanada dos Ministérios e do Palácio do Planalto. Iniciativas como a distribuição desse material são alvo de procedimento administrativo e pronta reação do Governo. Ao mesmo tempo, se ignora um atentado à separação entre religião e Estado em um dos Poderes da República, como ocorreu com a omissão do Governo Federal na eleição do Deputado Marco Feliciano para a Presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados.

Tendo em vista o exposto acima, a ABGLT solicita explicações imediatas sobre o veto a esse material produzido. Exige o fim de qualquer procedimento administrativo que tenha como foco a distribuição do material e informa que entrará com denúncia junto ao Tribunal de Contas da União pelos prejuízos causados pela suspensão de um material que consumiu recursos públicos em sua elaboração e produção.

Na expectativa de sermos atendidos, permanecemos à disposição.

Atenciosamente,

Carlos Magno Silva Fonseca
Presidente da ABGLT